Mortal Kombat | Resenha |
Poucas franquias passam pelo que Mortal Kombatpassou e conseguem se salvar. De ícone de violência de uma geração — responsável em parte pela criação do órgão regulador de idades ESRB — a esquecimento e descrença nas gerações posteriores, a franquia de lutas mais violenta da história dos games viu seu fim bater à porta quando a Midway anunciou sua falência, em 2009.
Ela foi salva graças à perseverança de um dos seus criadores, Ed Boon, e de uma nova casa, a Warner Bros. Interactive Entertainment. O cenário e as expectativas estavam montadas para o próximo título da série, e para representar essa nova fase, nada melhor do que um novo começo.
Mortal Kombat passava por maus lençóis. Desde MK4, ainda na época do PS1 e N64, nenhum lançamento da franquia era realmente capaz de reanimar a crença naquela história e naqueles personagens, principalmente pela confusão na já complicada trama do jogo. Mais recentemente, lançamentos no XBox 360 e no PS3 nem eram vistos com bons olhos, dado o grau de cansaço da marca.
Um dos últimos suspiros de “inovação” foi o crossover com a DC Comics (Mortal Kombat vs DC Universe, PS3 e Xbox 360), numa tentativa patética de recriar algo no padrão que Marvel vs Capcomatingiu, e que ficou bem aquém do esperado, por descaracterizar tanto o lado Mortal Kombat quanto o lado DC Comics.
Mas Ed Boon não desistiu. Comprando todo o share da franquia de sua antiga dona, e fundando um novo studio (chamadoNetherRealm Studio, desenvolvedor do novo jogo), Boon achou uma maneira de trazer MK de volta a cena: ser bom como antigamente. E nessa tônica, ressurgiu.
Existe um motivo, explicado pelo próprio Ed Boon, sobre o porque deste jogo se chamar somente “Mortal Kombat”, e não Mortal Kombat 9, 2011 ou o que quer que seja: Mortal Kombat (PS3 e Xbox 360)é realmente o primeiro jogo de uma nova geração.
Eliminando tudo o que atrapalhava nos anteriores (com uma bela desculpa de “linha de tempo”), a desenvolvedora entrega um jogo sólido, simples, nostálgico e ainda sim surpreendentemente novo. Você vai se ver em várias situações familiares, vai passar por uma história que até faz sentido (dentro do universo do jogo), vai re-encontrar personagens do passado, e se surpreender com novas feições das caras já conhecidas, tudo embalado numa jogabilidade simples e bem mais fácil de utilizar do que aqueles que fizeram fama nos arcades dos anos 90.
Seu ponto inicial nesta nova jornada por Outworld deve ser pelo modo história. Se nos games originais, notadamente MK 1, 2, 3 e Ultimate a história era sub-entendida, nesse novo jogo ela merece um lugar de destaque. Esse Story Mode está disponível para ensinar aos jogadores (principalmente os mais novos) tudo o que a mitologia Mortal Kombat engloba.
Num sistema de combate 2D com cenários remodelados diretamente dos games iniciais, você conhece a história por capítulos, e joga cada um deles com um personagen fixo designado. Você utiliza quase todos os jogadores do lado da Terra, e aprende a melhor forma de jogar com eles, e muito da importância sobre a renovação da série está aí: a NetherRealms queria que você esquecesse suas “pré-conceitualizações” sobre o personagem A ou B, e tivesse uma cabeça aberta para jogar de novo com aqueles que você não gostava em épocas passadas.
Assim, sua opinião muda, e você se sente instigado a testar todos os personagens, mesmo aqueles que você achava fraco, ou de combos difíceis.
Claro que temos algumas inovações, e elas foram bem colocadas. A jogabilidade de todos os personagens foi revisitada, alguns mais fortes perderam o poder, e alguns mais fracos ganharam combos mais fáceis de executar.
Como adição, uma barra de poder está presente, e você tem 3 níveis para melhorar ou modificar seus golpes e suas ações. O primeiro nível, chamado Enhanced, faz com que determinados golpes especiais fiquem mais fortes, tirando mais vida dos adversários, e consequentemente engatando combos mais poderosos. O segundo nível ativa o Breaker, onde uma sequência do adversário pode ser interrompida por um “combo breaker” da sua parte; e a terceira barra ativa uma outra novidade: o X-Ray Combo. Acionado de maneira simples, esses golpes são tão mais devastadores que somente uma visão de raio X ativa pode mostrar o que acontece com o corpo do seu adversário na hora dos golpes.
No final de cada luta seu personagem tem na pele marcado o que aconteceu com ele, no sistema de danos físicos aplicados no modelo de cada personagem. E cada tipo de machucado corresponde à uma “marca” diferente, entre elas queimaduras com fogo ou com ácido, choques, escoriações, cortes e fraturas. O resultado final pode até ser grotesco, mas estamos falando de Mortal Kombat.
Outra inclusão bem vinda ao jogo é o sistema Tag Team, onde você escolhe dois personagens e pode trocá-los a qualquer momento da luta, inclusive dentro dos combos. Cada modo de combate solo agora é pareado pelo modo Tag, e o jogo permite até 4 jogadores por console jogando quase ao mesmo tempo.
Por falar em combos, estes estão mais fáceis de engatar, devido à uma nova configuração de botões e um tempo maior de comando nos controles. Uma coisa que ainda me deixou frustrado é a área de encaixe dos golpes, que me pareceu bem ampla, o que permite ao game interpretar ações de maneiras bem esquisitas, como uma voadora que passou acima do seu personagem te derrubar mesmo agachado. Mas mesmo assim são partes tão incomuns que não chega a interferir com o andamento do jogo.
Sobre os personagens dos jogos anteriores, estão incluídos Baraka, Cyrax, Ermac, Jade, Jax, Johnny Cage, Kabal, Kano, Kitana, Kung Lao, Liu Kang, Mileena, Nightwolf, Noob Saibot, Quan Chi, Raiden, Reptile, Scorpion, Sektor, Shang Tsung, Sheeva, Sindel, Smoke, Sonya, Stryker e Sub-Zero.
Os donos de PS3 podem jogar com Kratos, da série God of War, e sua inclusão ficou realmente bem feita, e quase não há diferenças entre ele e os demais personagens; já estão confirmados Kenshi eSkarlet como personagens DLC, e Cyber Sub Zero (aparentemente o único personagem novo, junto com a Skarlet), que é desbloqueado dentro do Story Mode. Ainda temos Goro, Kintaro e Shao Kahn, mas somente Goro pode ser jogado brevemente no modo Challenge.
Além dessas formas, cada personagem ainda tem sua forma alternativa (que muitas vezes é somente uma troca de roupas), e o desenvolvimento de cada um deles chega a ser contado dentro do jogo. Como Jax perdeu os braços, como Kabal virou aquele ser mascarado, quem é Noob Saibot, quantos clãs lutam no torneio, e quantos são os Sub-Zeros, todas estas histórias são englobadas num ponto só, e encaixam bem dentro da trama.
Os cenários remotam aos primeiros jogos também, como a luta sobre a ponte de pedra (The Pit), a floresta assombrada, e lago de ácido e outros, mas ao contrário de alguns jogos da série, aqui a paisagem não interfere. É possível inclusive ver outros lutadores combatendo nos planos de fundo, e até alguns easter eggs estão presentes, da mesma maneira que os jogos anteriores (sim, fazer um Stage Fatality no cenário The Pit, com duas Flawless Victories te dá direito à um segredo. Mas desde que o trenó do Papai Noel apareça em frente à lua). Como a nostalgia está levando uma boa parte da diversão, os famosos Kombat Kodes estão de volta no modo versus, e descobrí-los habilita opções bem diferentes no jogo, como por exemplo lutas sem braço, lutas sem pulo ou sem usar especiais.
Dos modos de jogo, fora o Story já citado e o Versus, ainda temos mais novidades. No Challenge Tower, você deve conseguir objetivos específicos, não sendo possível escolher personagens ou adversários. Ainda inauguram alguns modos mais cômicos, no estilo “passatempo”, entre eles o Test Your Luck, onde o adversário, uma condição contra e uma a favor são sorteados na roleta; o Test Your Might onde basicamente você aperta dois botões até a força do seu golpe atingir um certo valor, e depois desfere o golpe na barra de medidas (visto desde o primeiro MK); temos o Test Your Sight, onde você precisa advinhar onde está a bola, depois de ser embaralhada embaixo de algumas cabeças; e o Test Your Strike, semelhante ao Might, mas dessa vez com limite inferior e superior, e com uma exigência de tempo também.
É uma maneira interessante de dar fator replay pro jogo sem cair muito na mesmice. Ainda temos a cripta (The Krypt), onde as moedas conseguidas nos demais modos de jogo são trocadas por fatalities, roupas, concept arts e outros, e tudo isso, depois de liberado, fica disponível na cidade de Nekropolis.
A área online, que tem se tornado mais importante nos últimos jogos de luta, também vem com algumas novidades interessantes, sendo a principal delas a chamada King of The Hill, onde basicamente o vencedor das partidas se mantém nas próximas, numa sala com até 10 jogadores.
Outros modos específicos como partidas 1 a 1, Ranked ou Privatetambém estão disponíveis, mas o principal atrativo fica por conta da velocidade com que tudo acontece. Basta escolher um modo e em poucos minutos você está na luta. Em geral, não existe lag durante as partidas, mas quando a lentidão ataca fica praticamente impossível jogar. Cada combate te gera koins para serem usadas naKrypt, e você vai querer gastar lá.
É seguro afirmar que Mortal Kombat se redescobriu. Ao voltar às origens, e tentar dar um rumo à sua complicada história, MK chega na nova geração (finalmente) com um jogo que não é cansativo, e que explora todos os arredores que um jogo de luta pode ter. Ao trazer de volta os personagens consagrados, garante a familiaridade dos jogadores, e com os cenários remodelados, a nostalgia entra em ação, e tudo isso envolto numa jogabilidade simples e objetiva, recheada com modos alternativos e um Story Mode decente.
Seja por detalhes que remetam ao Mortal Kombat 1, 2 ou 3, seja pelo fato do Shao Kahn ser ainda um apelão (mas um pouco mais fraco), ou seja pela sua curiosidade em conhecer este jogo (caso não conheça), acredito ser seguro dizer que Mortal Kombat ganhou mais um pouco de confiança dos gamers, e que a franquia não acabou de vez. Ou, em termos práticos, ela ganhou um “Kontinue”.